domingo, 25 de março de 2012


O MENINO, O ELFO E A OCARINA


Em uma terra longínqua nos confins gelados do norte vivia um bravo e alegre garotinho, de cabelos loiros e curtos, magricelo e sem pelos na face. Pouco sabia sobre os grandes mistérios que o aguardava, mas ei de contar a vocês sua historia de aventuras, algumas memoráveis outras um tanto doloridas, mas todas sem duvida ensinaram à esse pequeno rapaz a nunca baixar a guarda e sempre seguir em frente.
Vivia em uma pequena vila que não era tão gelada assim, fazia sol todos os dias e a lua brilhava no alto do céu colorido pelas auroras. Sempre fora um garoto bobo, sorria até quando chovia, e como gostava de chuva, corria pelas  trilhas lamacentas com os filhotes de lobo feito louco, gostava demasiado de animais, principalmente os lobos.


Certa vez caminhando pela floresta apenas com sua ocarina em mãos avistou em uma clareira uma sombra, tentou se aproximar, mas não foi cauteloso o suficiente e a sombra ouviu os sons de seus passos sobre os galhos úmidos no solo e correu desajeitadamente por entre as árvores,  tentou acompanhá-la em vão, logo estava só novamente, aquele breve susto trouxe uma vontade pela musica, pegou a ocarina e soprou uma canção divertida e alegre que fazia as folhas secas saltitarem a rodopiarem a sua volta. Com apenas algumas notas pôs toda a mata a dançar, e foi então que a sombra se aproximou por suas costas e com um rápido movimento arrancou a ocarina de sua boca.
Não era uma sombra, mas sim um elfo, de orelhas e membros longos e pontudos, era mais alto do que o garoto, mas também não passava de uma criança como ele. Examinou o instrumento com cuidado, assoprou de todas as maneiras possíveis e quando viu que não conseguiria tirar nenhuma nota daquilo devolveu ao menino, decepcionado sentou-se numa pedra e pôs se a bufar pequenas nuvens de vapor. Tinha os cabelos curtos e encaracolados, era feio, nem um pouco parecido com as lendas que o povo contava sobre os elfos, não que fossem raros, mas ninguém naquela região tinha visto um até então.
Vendo o desanimo do elfo o menino chegou um pouco mais perto e soprou algumas notas, simples, fluidas, divertidas, que fizessem aquele ser estranho sorrir um pouco, vendo que o elfo magricelo lhe deu atenção, entregou a ele a ocarina e colocou seus dedos nos buracos certos do instrumento e fez o sinal para que soprasse, ao sair o primeiro som, mudou os dedos de buraco e pediu para que continuasse a tocar, as notas foram saindo de vagar, meio roucas e desafinadas, mas era um começo que alegrou o menino de orelhas pontudas.
Começou ali uma amizade promissora, uma aventura longa com muitos desafios e também a historia de um garoto que um dia se tornaria muito alem do que todos pensavam.




(Allarious)


sábado, 17 de março de 2012


Oeeeeeeeeee!!!! Baum?!!!

                     Eaew galerinha, em vista que somos um “bloguinho” no meio de tantos outros que começaram e/ou estão começando, até que estamos bem nesse universo estranho e maluco que chamamos de World Wide Web. Ao que parece mesmo tendo um conteúdo voltado para um nicho mais fechado temos ai uma media de 40 acessos por dia e ficou bem claro que o povo quer, exige e pede cada vez mais, incessantemente e até com violência por IMAGENS!!!!  Sim imagens e sim você terão imagens. Até porque é visível o peso dos textos, digo na questão de linhas sem pausa, não é todo mundo que curte ler na frente de uma tela.
                      Com o recado dado acho que esta mais do que em tempo de começar esse singelo projeto pessoal dentro do blog, será uma serie de pequenas crônicas com ilustrações. A principio o modelo será o mesmo que usamos pro meu ultimo conto “Meu anjo” (link), mas com uma temática diferente, alias os temas de nossas historias também estão caindo na repetição 
                      Espero que gostem do que esta por vir, pois estou preparando com um carinho especial e em breve (mas não tão breve assim) estas mesmas crônicas irão servir pra um projeto ainda mais ambicioso envolvendo animações, mas não iremos focar no futuro e sim no presente.
Obrigado a todos os leitores e leitoras, seus lindos sem vocês não seriamos  muito mais do que três nerds sem o que fazer. Ah e por favor comentem para que possamos saber o que vocês pensam sobre os conteúdo como podemos melhorá-los.   

(by Allarious)

segunda-feira, 12 de março de 2012

La marseillaise


Eram exatamente sete horas.

Daniela estava no quarto, tapando os ouvidos com o travesseiro para não ouvir a briga lá fora. Era a quarta vez no dia que seus pais discutiam aos gritos daquele jeito, e ela não estranharia se ouvisse o barulho de um tapa. Até porque, de vez em quando, sua mãe merecia, mesmo. Fora ela o gatilho daquela e de qualquer outra briga que houvesse dentro daquela casa, com sua mania de aumentar os detalhes da convivência da família e transformá-los em tragédias shakesperianas. À tragédia real, contudo, ela não dava atenção alguma: sua filha.

Daniela nasceu de uma gravidez difícil, seguida de um parto que não podia ser descrito por expressão nenhuma além de “suplício”. Sua mãe quase morreu no processo, e apenas por sorte a menina não foi natimorta – se dependesse da própria Daniela, ela teria escolhido não ter sorte alguma. Cresceu ouvindo relatos de uma época áurea na família tanto do pai quanto da mãe, e observando de muito perto a desgraça em que ambas as famílias caíram após seu nascimento. Talvez por isso caiu em depressão logo na infância, e jamais levantou-se para chacoalhar essa mortalha; não demorou para que o transtorno obsessivo-compulsivo e a síndrome do pânico se apoderassem de sua já tão frágil mente. Também era muito antissocial e antipática, e não conseguia se relacionar com ninguém por um intervalo maior que algumas horas.

A briga acabou mais cedo que o esperado, e Daniela enfiou a cara no travesseiro, tapando os olhos também. Queria chorar, mas se sua mãe entrasse no quarto e percebesse, ela estaria com muitos problemas. É difícil ter depressão numa casa em que chorar é expressamente proibido, mas ela conseguia. Mais uma vez, engoliu o choro. Não teve tempo de se encontrar com seus pensamentos, porque sua mãe irrompia no quarto, barulhenta, dizendo que o pai de Daniela lhe deixara sozinha para cuidar das galinhas e que era trabalho da filha fazê-lo, porque ela já estava cansada daquela vida completamente solitária, estava cansada de ter que fazer tudo enquanto Daniela ficava no quarto o dia todo, estava cansada de trabalhar do mesmo jeito todos os dias com todas aquelas dores que sentia por causa dos seus problemas de coluna. Aproveitou para acrescentar que era tão feliz quando estava solteira... E tinha se casado com o pai de Daniela para dar-lhe uma vida digna, com uma família completa, mas tudo o que tinha era um marido ingrato, uma filha estranha e malcriada e os dois cachorros, que pareciam ser os únicos naquela casa que se importavam com ela.

Saiu do quarto e Daniela levantou-se molemente, sentindo o ódio pulsar em suas veias, correndo mais rápido que o sangue. Foi até a cozinha para pegar o milho das galinhas, e sua mãe estava cortando carne. Porque tremia muito, por causa do ódio incipiente que lhe fervia o sangue, derrubou a tigela de milho, e observou os grãos tingirem o chão clinicamente branco de amarelo ouro enquanto ouvia a mãe dizer que, além de tudo, ainda era incapaz de segurar uma tigela.

O ódio gritou tão alto dentro de seu cérebro que Daniela perdeu completamente a noção do que estava fazendo e deixou-se levar por ele, pulando sobre a mãe e lhe roubando a faca para atacá-la com ela. Não se deu conta inicialmente da quantidade de sangue que manchava o chão, porque sua mente perturbada não estava preocupada com isso. Quando finalmente deu por si, parou sua mão no ar, ao caminho do pescoço da mulher, e encarou-a. Sua mãe estava completamente desfigurada e suja de sangue até os quadris; tinha os olhos fechados e muito provavelmente não respirava, mas Daniela não atentou para isso. Então começou a chorar, mas não de tristeza, e sim porque tinha muito a chorar, e o faria assim que lhe deixassem. Tremia muito, talvez de raiva ou então de susto – mais provavelmente de raiva. Sua mão fraquejou a e ela soltou a arma.

Quando a faca tocou o chão, eram exatamente sete e dez.

quarta-feira, 7 de março de 2012

Meu Anjo


            Estava ele deitado em sua cama no vazio escuro de seu quarto às nove horas da manhã, janelas fechadas, acordado, mas ainda se recuperando da ressaca da noite passada, um horrendo porre de vodka com rum.  Não havia nem tirado as calças, capotou na cama sem camisa apenas, os coturnos estavam nos pés, mas desamarrados, o quarto cheirava ao cigarro que queimara a noite toda no cinzeiro.
            A luz do dia invadia discretamente o quarto pelas fendas da janela, o caos em sua cabeça impedia-o de levantar, o teto girava e ele voltou a sonhar, de olhos abertos, as sombras na estante dançavam conforme os raios de sol saltavam pela janela. Não demorou a vê-la, ali parada em pé, vestia um manto preto apenas, as asas estavam encolhidas, cinzentas com penas falhas, do capuz caiam os cabelos vermelhos como fogo, uma chama fraca quase apagada discreta de inicio, os olhos verdes eram esmeraldas derretidas cintilando dentro do capuz e tinha o sorriso mais belo que qualquer deusa jamais sonhara ter.
            Os raios de luz cessaram, as asas se dissiparam e o manto virou cinzas ao caírem no chão, estava nua, de pele branca e sem vida, os seios firmes e macios meio cobertos pelas labaredas dos cabelos, descalça de pés pequenos e delicados, com dedos pequenos, roliços e apertados, de calcanhares lisos e tornozelos frágeis, as pernas esculpidas em mármore branco, de quadril não muito largo, com não mais que alguns poucos fios na virilha coberta pelas sombras. Sorriu para ele, um sorriso cheio de alegria e malicia, tentou se mexer, mas o álcool fazia seu papel de vilão. Em passos silenciosos ela chegou até a cama, colocou a mão em seu peito e sussurrou em seu ouvido, os dedos deslizaram para a fivela do cinto que depois de retirado veio ao chão, rápida e ágil ela montou-o e beijou sua boca, nesse momento seu membro sentiu vida e o álcool em sua mente passou a ser uma leve melodia.

            Abraçou-a com as mãos tremulas e a beijou uma vez mais, a língua estava confusa com aquele êxtase, ela dançava sobre seu corpo e levava as mãos dele aos seios, não havia gemidos, apenas a respiração ofegante e o calor dos cabelos em chamas que lambiam ambas as faces, por alguns segundos se esqueceu de tirar as calças, então o fez desajeitadamente. Ao entrar nela as chamas dos cabelos brilharam como o próprio sol, a dança ganhou mais movimentação quando um toque agudo seguido de uma pausa e novamente o toque. Os olhos se abriram novamente, sonho, fora só um sonho, o celular despertara, olhou ao redor do quarto e não viu rastros dela, foi tudo apenas um maldito pesadelo.
            A ressaca ainda o atormentava, mas o verdadeiro sofrimento era saber que foi tudo uma emocionante e maravilhosa mentira, uma falsa promessa, sentou-se na cama e desligou o alarme. A cabeça latejava, pegou o colar de prata que sempre carregava consigo, abriu o pingente para vislumbrar a foto dela mais uma vez. O sangue fervera de imediato, não conseguiu conter as lagrimas, a raiva envenenava seu coração, apertou o colar com a mão e pendurou-o no pescoço, abriu a gaveta do criado mudo e ali estava, tocou a coronha de couro frio com as mãos tremulas, puxou da gaveta, cerca de um quilo e meio, cano longo e tambor com seis disparos. Passou a mão na arma calmamente para sentir o metal gelado em suas mãos, pensou em várias maneiras enquanto as mãos tremiam e o álcool martelava sua cabeça, cada escolha, cada possibilidade, tudo o que podia e o que fez, mas no fim todos os pensamentos terminavam nos olhos verdes daquele rosto de nariz arredondado com algumas sardas e cabelos ruivos.
            O indicador fixou-se no gatilho, o cano encontrou seu queixo, a voz quase não saiu quando murmurou para si mesmo em meio as lagrimas que desciam dos olhos.
            - Estou a sua espera meu anjo. –

            ( Allarious )

domingo, 4 de março de 2012

Por Você


                Essa é a história de Leal. Não era um garoto diferenciado, nem muito alto, nem um bom atleta, nem um bom dançarino. Mas sempre achei que nele havia algo especial, diferente dos demais. Sempre adorei seu cabelo castanho e um pouco comprimo, e o jeito delicado que o desembaraçava. Eu ficava feliz em vê-lo, mesmo sem poder ver seu rosto.
                Eu o acompanhava quando a aula terminava. Deixava entre nós uma pequena distância e o seguia até sua casa. Nas manhãs, acordava bem cedo e fazia o mesmo enquanto ele se caminhava até escola. Ele nunca me notou, mas eu não me importava.
                No começo do ultimo mês ele estava muito triste. Chorava muito e ninguém sabia o motivo. Um dia um policial entrou na sala de aula e o levou para conversar com o diretor. Eu resolvi fingir uma dor de cabeça para poder sair também. Cheguei o mais próximo possível de onde eles estavam, o suficiente para ouvir a conversa. Agora sua tristeza fazia sentido.
                Na semana seguinte seu rosto triste foi substituído por um rosto pálido e assustado. Desde o dia do enterro de seu pai, ele havia ficado muito deprimido. Seus amigos o apelidaram das coisas mais horríveis que eu jamais havia escutado. Tudo porque ele perdeu seu sorriso, não conversava com ninguém e não tinha mais vontade de fazer nada.
                Tudo que eu mais queria era que minha tarde e minha noite passassem o mais rápido possível, assim finalmente o dia amanheceria e eu poderia vê-lo, acompanhar sua caminhada até a escola e ter certeza de que nada o incomodaria. Na outra semana, ao ficar sentado chorando durante a aula de educação física, um grupo de jogadores do time da escola o cercou. Eles o xingaram, o agrediram e rasgaram seu material. Foram surpreendidos por um garoto grande, conhecido por ser o capitão do time. Mandou que todos parassem e estendeu seu braço. Ao ajudar o pobre Leal a se levantar, o soltou, acertou um golpe em sua barriga e cuspiu no seu rosto. Eu não aguentei, corri para longe e comecei a chorar.
                Passado aquele dia, mais uma vez a sala de aula fora visitada por um policial, que conduziu aqueles brutamontes que chutaram e cuspiram em Leal para fora da classe. Eu sabia que logo mais haveria justiça. Agora a sala com seis alunos a menos estava mais confortável para mim. Porém, depois desse dia ninguém mais sorriu na escola.
                Escutavam-se nos noticiários todos os dias sobre a história do adolescente que matou seus amigos a facadas no peito, arrancou e esmagou seus corações e no dia seguinte se matou quando estava sozinho. Mas as coisas não estavam como deveriam. Leal não teve seu sorriso de volta. Eu não conseguia entender. Seu pai que fazia... aquilo, não o incomodava mais. Aqueles idiotas da classe não estavam mais lá para o maltratarem. Porque seu sorriso não voltou?
                Não podia entender mais nada. Todos agora o tratavam como um monstro, como alguém perigoso. E não havia no mundo uma pessoa mais maravilhosa que Leal. Mas ninguém conseguia ver essas qualidades, a sinceridade e a delicadeza de cada detalhe de seu corpo e de seus atos. Uma coisa seria não ter amigos por estar chateado, mas o que aconteceu foi diferente. Ninguém o queria por perto, todos o odiavam.
                Meus dias ficaram mais tristes e meu mundo se tornou vazio. A escola havia sido fechada depois do que aconteceu. Não era para ser assim, não era.  Agora minhas manhãs, tardes e noites eram cinzentas e sem graça. Duas semanas sem ver Leal foram uma eternidade. Depois da cerimônia em homenagem aos trinta e dois alunos mortos, eu percorri toda a quadra a procura de Leal, no meio de pais, professores e alunos. Finalmente o vi. Trocamos olhares por alguns segundos. Sua boca abriu. Ele ia falar comigo, eu sei que ia. Mas foi interrompido e levado por homens vestidos de branco. Reparei que sua mãe chorava quieta, como se não quisesse ver seu filho ser levado. Demorei a entender o que havia acontecido.
                No dia seguinte, quando finalmente consegui passar pelo corredor principal do hospital, avistei o quarto número 122. Ele estaria lá, eu tinha certeza. Estava difícil correr, pois minha sandália estava com um pouco de sangue ainda fresco. Abri a porta e o vi amarrado na cama em uma camisa de força. Estava dormindo, tinha um rosto angelical como se estivesse sonhando. De repente a porta foi chutada e um homem de branco entrou. Durou alguns segundos.
                Ainda vivo, tendo pequenos espasmos no chão enquanto o sangue jorrava de sua garganta, suas ultimas palavras soaram como uma piada para mim, porque a resposta era óbvia. Por quê? Porque uma pessoa incapaz de perceber a graça de Leal, não merece ter um coração, assim como seu pai, assim como seus amigos, assim como todos desse hospital, que duvidaram de sua bondade.
                Após abrir seu peito e esmagar seu coração com minha sandália, percebi que Leal estava acordado atrás de mim. Fiquei tão nervosa, mas sabia que esta seria a hora certa para falar com ele pela primeira vez. Limpei um pouco de sangue de meu rosto e me aproximei.
                -Leal?
                -Fique longe de mim!
                -Mas... por quê?
                -Foi você que fez tudo aquilo?
                -Eu... tentei fazer por você... porque...
                -Você é um monstro!
                -...
                -O que vai fazer agora? Me matar também?
                -Não. Acho que também não sou digna de tê-lo.
                -Está falando de mim?
                -Não... estou falando dele.
                -Não faça isso, por favor.
                -Entenda isso como um reconhecimento de que errei... aceite ele.
                E naquele dia, meu coração doeu pela última vez.

                ( Dan )